Abro os olhos lentamente e a custo… algum ruído, que não consigo ainda identificar, me acordou. Os traços luminosos de cor âmbar que vêm do relógio despertador dizem-me que são 08:30. Já? Estou atrasado! Então hoje isto não apitou porquê? Não, calma… hoje é domingo! Enquanto o coração volta a acalmar o seu ritmo, pergunto-me afinal que ruído foi aquele que me acordou? Ao meu lado tu dormes ainda, na mesma posição em que me lembro de ver-te aconchegar para dormir…
O ruído vem de fora do quarto. Levanto-me o mais silenciosamente possível, para te deixar descansar mais uns minutos. Ao passar pela sala confirmo as suspeitas sobre o tal ruído misterioso! Na idade dela também me levantava cedo ao fim de semana para devorar todos os desenhos animados que a televisão passava, algures entre as 7 e as 11 da manhã. Nessa altura, entre a Rua Sésamo, os Amigos do Gaspar, o Sport Billy e os Power Rangers (os originais!), a manhã parecia correr rapidamente até chegar a hora do almoço. Agora os programas são bastante diferentes… mas o fascínio parece manter-se inalterado. Estranhamente, hoje o irmão resolveu não a acompanhar no rito semanal dos desenhos animados madrugadores. Dorme ainda.
Regresso à sala, onde me sento ao lado dela, tentando descobrir o inadiável interesse do que a televisão passa e que torna inaceitável estar mais tempo na cama. Quando lhe pergunto porque é que aquele ser impossível de identificar (será certamente um qualquer espécime alienígena) acaba de destruir em mil pedaços um qualquer objecto indecifrável para mim, ela limita-se a responder-me “Oh pai, não percebes nada!” enquanto me abraça pelo pescoço… Ora toma, já não tens idade para perceber desenhos animados, já devias saber isso!!
Passados uns minutos, somos já três a delirar com os desenhos animados, quando então tu entras na sala a dizer que bem te parecia que tinhas três crianças a teu cargo! A vingança não se faz esperar… “moche à mãe!!”… e lá vamos nós a correr atrás de ti, enquanto finges não conseguir correr suficientemente rápido para conseguir fugir da perseguição implacável de duas crianças ainda pequenas e um adulto que resolveu ajudá-las!
Enquanto eles regressam à sala, nós ficamos mais uns segundos deitados no chão. Abraçamo-nos… tento passar para palavras o que me passa pela cabeça… que dás sentido à minha vida, que sou verdadeiramente feliz ao teu lado, que valeu a pena passar por tudo para ficarmos juntos… limito-me a dizer-te ao ouvido: “amo-te tanto”. Isso basta. Nessas palavras está condensada toda a nossa história, passado, presente e futuro. E isso, o bom e o mau, nunca desaparecerá.